Tuesday 26 May 2009

Um Reporter no Paquistao

Arthur Veríssimo, repórter de 48 anos, acumula milhas aéreas e histórias para contar sobre os lugares e as pessoas mais incríveis do mundo
Em sua eterna busca pela luz, nosso viajante encontra uma ditadura corrupta e enfrenta alguns olhares desconfiados no Paquistão

Mesquitas, autoflagelação, Baluchistão, islamismo, bombas nucleares, dervixes, Al Qaeda, Caxemira, críquete, squash e um governo que está entre os mais corruptos do planeta. Esse é o cenário do Paquistão, que neste ano de 2007 completou 60 anos de independência, comemorada pelos seus 165 milhões de habitantes.
Para alguém na minha posição, a vida por ali não é fácil. Afinal, jornalistas, ONGs e grupos que defendem os direitos humanos são extremamente malvistos pelas autoridades de Islamabad. Segundo o ditador Pervez Musharraf, só são divulgadas barbaridades e mentiras sobre o seu país. Depois de oito anos como presidente — sempre com o auxílio americano —, Musharraf luta pela sua sobrevivência, recusando-se a ceder o poder a civis e com uma contínua pressão dos adversários políticos e dos extremistas islâmicos ao longo da fronteira com o Afeganistão.Mas esse está longe de ser o motivo que me levou até lá. Fui ao Paquistão para conhecer a majestosa e decadente cidade de Lahore e as entranhas do poder de Islamabad. Minha aventura iniciou-se no aeroporto de Nova Délhi, capital da Índia. Os funcionários da PIA (Pakistan International Airways) queriam saber o motivo da viagem e por que um brasileiro nutria o desejo de conhecer o Paquistão.

A viagem de Délhi para Lahore dura 45 minutos. Dentro do avião, quatro passageiros não tiravam os olhos de mim. Quando fui ao banheiro, a porta foi pressionada uma dezena de vezes. Foi a viagem aérea mais tensa da minha vida. Quando desembarquei em Lahore, olhares de todos os lados acompanhavam meus movimentos. Tive que mostrar meu passaporte em seis ocasiões e abri minha mala por mais uma dezena de vezes (tambem ja passei por isso). Um amigo italiano me aguardava na saída do aeroporto e, quando percebeu meu espanto terminal, deu sonoras gargalhadas.Em vez de me acalmar, Franco, o italiano, me deu um toque para ler o quadro de avisos no hotel, no qual estava escrito: “Devido à proximidade de fronteira com a Índia e as regiões tribais, locais propícios à rebelião e à guerra, é aconselhável aos hóspedes guardar seus pertences no cofre”. Depois de uma merecida noite de sono, fui comprar o clássico “Shalwar Quamiz”, uma espécie de pijamão-bata, a roupa típica que os paquistaneses usam diariamente. Tudo com o intuito de me fundir à paisagem de Lahore, que é uma cidade repleta de maravilhosas mesquitas, fortes, mercados decadentes, jardins abandonados e templos de santos sufis.
Com tempo livre, dei uma passeada em Islamabad, capital do Paquistão. É uma cidade que não deixa nada a desejar a qualquer metrópole ocidental. Carros importados, shoppings, restaurantes, galerias de arte, parques e uma certa semelhança com Brasília, com suas largas avenidas e suspeitas de corrupção. As ruas são repletas de ônibus e caminhões que mais parecem instalações.
Na volta a Lahore, resolvi caminhar pela Shahrah-e-Quaide- Azam, a Avenida Paulista de lá. Observei uma movimentação febril a duas quadras. Uma multidão se espremia para acompanhar uma romaria que entoava cânticos de lamentação. Bandeiras tremulavam por todo o ambiente. Três cores predominavam: verde (que significa o Islã), preto (luto) e vermelho (sangue derramado). De um lado, uma falange de policiais armados. Do outro, um bando de alucinados xiitas esparramando fé pelos lábios com os corpos cobertos de sangue. Centenas de homens se autoflagelavam com chicotes e correntes. O chicote possuía de cinco a dez tiras: na ponta de cada um estava engatada uma lamina afiadíssima.Depois fiquei sabendo que todos os anos é comemorado no décimo dia do mês muçulmano de Moharram o luto xiita que revive a morte violenta do imã Hussein, neto do profeta Maomé, morto pelo califa sunita Jazid em Karbala (Iraque). A tradição conta que Hussein Ibn Ali foi decapitado e mutilado no ano de 680 d.C. Esse período marcou a divisão do mundo islâmico entre os ramos sunita e xiita. No olho do furacão do martírio coletivo, observo um grupo de garotos com chicotinhos. Decido retornar ao hotel para me refazer. No dia seguinte, teria uma longa viagem de volta para o Brasil.
Longe dos olhos sinistros que o perseguiram pelo Paquistão, nosso andarilho flagrou um caminhãoinstalação e interagiu com um mascate em Islamabad (abaixo)

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