Segunda-feira (19 de novembro de 2007)
Bahawalpur – perto do vilarejo de Bela Khan (102 km)
O que eu iria encontrar pelo caminho a partir de agora era imprevisível. Desta vez eu não conhecia mais ninguém para me dar um teto ou um prato de comida e sabia que contar com a sorte que eu tive em Multan não era uma boa idéia. Apenas poderia me preparar para acampar em algum lugar pelo meio do caminho e levar comida para alguns dias comigo.
Pela manhã eu deixei Bahawalpur por uma estrada bastante diferente da que eu me acostumei a percorrer aqui no Paquistão, desta vez o caminho era ruim e com muitos buracos e defeitos. Pensei que o caminho seria assim até eu chegar ao meu destino, mas por sorte estava enganado. Depois de 10 quilômetros eu entrei novamente na autopista (National Highway n. 5) e voltei a pedalar da forma que estou acostumado.
Mais uma vez contei com a sorte e com a ajuda dos caminhões que pasavam ao meu lado e por vezes geravam o “vácuo” que eu precisava para escapar do vento e desenvolver uma velocidade boa. Com isso, consegui passar pelo caminho monótono e desértico mais rápido até um momento que acreditei estar na metade do caminho até a próxima cidade e resolvi parar para acampar num posto de gasolina do caminho.
Procurei um posto grande, 24 horas e com um segurança. Quando encontrei pedi para acampar no pequeno gramado no fundo do posto de gasolina, que ficava levemente afastado da estrada, por onde passavam os caminhões mais barulhentos que eu já vira. A princípio tive bastante sorte, o posto era bom, tinha um banheiro limpo e não fazia muito frio, o suficiente para eu não precisar tirar meu equipamento de frio da mala.
Depois de uma banho frio e comer no restaurante que ficava a poucos metros do posto de gasolina eu entrei em minha barraca e somente por volta das 9 horas da noite eu resolvi dormir. No entanto, descobri que mesmo estando numa região seca e desértica, a noite era fria e úmida. Fui obrigado a colocar a segunda capa da barraca e até mesmo a entrar no meu saco de dormir para completar a barulhenta noite.
Terça-feira (20 de novembro de 2007)
Perto do vilarejo de Bela Khan – Sadiqabad (104 km)
Acordei cedo, porém sabia que teria que esperar um bom tempo até a minha barraca secar. Da forma que ela estava eu não conseguiria guardá-la. Aproveitei o tempo para tomar um café da manhã e guardar tudo enquanto esperava a barraca secar. Nesse meio tempo, entre acordar e partir, eu vi uma caminhão carregado de óleo diesel chegar no posto e ter a válvula que controlava a saída do combustível estourarda. Isso resultou num banho de diesel em alguns homens que tentavam controlar o desastre e numa pequena piscina no chão do posto.
Após o show eu já estava coma barraca seca e pronto para guardá-la. Mais alguns bons minutos e pronto, tudo certo para ir embora. Subi na bicicleta e segui na direção de Sadiqabad, a próxima cidade de porte médio em meu caminho. Pensei que o caminho seria fácil com o dos dias anteriores, mas me enganei. O vento soprou contra mim hoje e os caminhões não foram tão amigos quanto os dos dias anteiros.
Meu início tardio resultou numa chegada igualmente tardia. O caminho foi monótono e igual ao dos outros dias, exceto pelo fato de hoje eu ter visto não apenas um caminhão tombado na pista, mas sim 3 e outros veículos batidos. Fora isso o caminho foi feito de deserto e poeira. Quando cheguei em Sadiqabad, queria apenas encontrar um hotel para passar a noite e ter um bom descanso.
Perguntei para um sujeito que falava inglês onde poderia encontrar um hotel e ele me indicou 2. Melhor do que isso, mandou um de seus funcionários me levar até o hotel mais próximo. Pelo caminho logo descobri que o funcionário além de não falar inglês (até aí tudo bem), não tinha a mínima idéia de onde ficava o hotel e também era completamente analfabeto (assim como boa parte da população do Paquistão). O resultado da ajuda do funcionário foi nulo, já que além de tudo ele me levou para um hotel que não aceitava estrangeiros.
Percebi que eu estaria melhor sozinho que acompanhado por aquele sujeito que parecia mais perdido do que eu. Segui então para o centro da cidade com a esperança de encontrar um lugar para passar a noite. Logo encontrei o que queria e este hotel sim aceitava estrageiros, provavelmente o único da cidade que fazia isso. Instalei-me alí e depois segui para um restaurante para comer e descansar para continuar minha jornada pelas estradas do Paquistão.
Quarta-feira (21 de novembro de 2007)
Sadiqabad – Ghotki (91 km)
Logo que acordei ao som de marteladas, serras, buzinas e jumentos debaixo da minha janela, localizada no centro de Sadiqabad, percebi que seria bom não perder muito tempo iniciar minhas atividades. Minha prioridade hoje era arrumar a roda da minha bicicleta que havia tido um raio quebrado ontem logo que entrei nesta cidade. Tomei um dos raios reservas que levo comigo, que por sinal já estão acabando e desci até uma espécie de sala de motores onde eu havia sido obrigado a colocar minha magrela.
Alí troquei o raio quebrado e descobri que havia mais alguns probremas na roda. Enfim, arrumar tudo e alinhar a roda me tomou mais de 30 minutos e só então eu podia ir tomar meu café da manhã. Não sei porque, mas eu já não aguento mais tomar o café da manhã daqui. Nada contra chapatis e vegetais apimentados, mas creio que meu corpo está pedindo algo mais com a cara do que eu comia no Brasil: um pão francês, queijos, yogurt e frutas.
Como eu sou obrigado a comer o que tiver para poder pedalar, eu saí para as ruas em busca de algo. O pão de estilo europeu e o queijo eu não encontrei, mas já sabia que não encontraria – ainda mais em Sadiqabad. O yogurt eu também não encontrei, mas poderia haver em algum canto da cidade. Por fim, encontrei frutas, que não existem numa variedade enorme como no Brasil, mas sempre tem uma cara boa. A frutas que sempre há por aqui são: banana, um tipo de mexerica, uma goiaba que tem forma de pêra (é verdade), maçãs e a favorita deles, romã, que não tem comparação com a pobre romã que eu via no Brasil. Aqui a romã tem quase um tamanho de um côco pequeno, tem uma cor viva e conta com sementes bastante suculentas.
Com o que eu enontrei, fiz meu café da manhã com frutas, incluindo uma romã, que de tão grande deu até trabalho para comer. Ao final da minha refeição e de arrumar tudo para seguir viagem já era próximo das 10 da manhã, mas eu tinha a vantagem de ter que pedalar menos de 100 quilômetros hoje. Pela pobreza das ruas desta cidade eu cheguei até a auto estrada e logo me deparei com o que seria o meu maior problema hoje: o vento contra (mim).
Nenhum momento da pedalada foi fácil e eu nem tinha idéia da onde iria chegar. Havia apenas visto um pequeno povoado chamado Ghotki no mapa e achei que seria uma boa ficar por alí hoje. Com minha velocidade comprometida devido ao vento que me segurava de forma incrível, segui de forma mais lenta e parei algumas vezes para descansar. Minha salvação foi entrar atrás de um lento caminhão que passava na estrada e seguir atrás dele, protegido do vento.
De toda a forma, minha pedalada nesta região árida do país foi mais demorada que o normal no dia de hoje. Cheguei em Ghotki próximo do final da tarde e percebi que o local era mesmo pequeno e não contava com estrutura alguma. Para a minha sorte, depois de pedalar um pouco pelo local eu encontrei um pequeno hotel na beira da estrada, já na saída da pequena cidade.
Não era um local exemplar, mas era suficiente para uma noite e para não precisar montar minha barraca. No final da tarde já fazia frio e eu tomei uma banho rápido para então cair na cama e me preparar para descansar e continuar minha pedalada até a cidade de Sukkur amanhã.
Quinta-feira (22 de novembro de 2007)
Ghotki – Sukkur (61 km)
Ao começar o dia de hoje eu percebi que já estava cansado de pedalar sem parar por tantos dias. Precisava de um descanso e esse descanso eu me daria em Sukkur minha próxima parada. Mesmo assim o descanso teria que ser curto, pois meu visto para o país estava acabando eu precisava chegar até Quetta para estendê-lo e ganhar mais alguns dias no país o que seria suficiente para terminar minha pedalada por aqui.
Depois de um café da manhã de frutas e um chapatti eu segui para a estrada, que passava na porta da hospedagem onde eu estava ficando. Alí percebi que não me falatava muito para chegar em Sukkur, quase 60 quilômetros e isso seria bom para mim, que já estava cansado. O ruim foi que o vento ainda seguia contra mim e não me dava nenhum descanso pelo caminho. Hoje eu já não tinha nem mais energia para acelerar e conseguir entrar no “vácuo”da traseira de uma caminhão. Contentei-me em seguir num ritmo mais lento, sabendo que não estava longe de meu objetivo.
Como havia saído cedo de Ghotki eu consegui chegar não muito tarde em Sukkur, onde demorei para encontrar um hotel, já que a cidade era dividida e contava com o lado pobre, de hotéis baratos, mas completamente insalúbres, e o lado menos pobre, de hotéis melhores, porém caros. Percebi que ficar no lado pobre seria um desafio e para descansar (a única coisa que eu queria) seria quase impossível. Segui então para o lado menos pobre, onde consegui negociar um preço melhor em uma das hospedagens e então ficar por alí por uma noite.
Comi bem hoje, descansei e planejei minha ida até as ruínas de Moenjo Daro, que ficava numa cidade próxima de Sukkur, aonde eu iria de ônibus amanhã.
Sexta-feira (23 de novembro de 2007)
Sukkur – Moenjo Daro – Sukkur (ônibus)
Hoje não coloquei o despertador para tocar e despertei um pouco mais tarde, mas ainda a tempo de seguir para Moenjo Daro e ver um pouco das ruínas dessa civilização de mais de 5000 anos. Logo pela manhã percebi que não seria fácil chegar lá. Do meu hotel tive que tomar um rickshaw até o terminal de ônibus, a cerca de 5 quilômetros de distância. Depois tomei um ônibus até a cidade de Larkana, base da família Bhutto e localizada a apenas 30 quilômetros de Moenjo Daro.
Quando cheguei em Larkana, depois de 1 hora e meia de viagem, tive que tomar outro pequeno táxi até o local da onde saiam os veículos para Moenjo Daro. O problema foi que no caminho o taxista encucou que eu tinha que ir até a polícia para obter um guarda-costas e depois segui para onde eu queria. Ele parou numa delegacia e os policiais deram risada da cara dele e o mandaram para outro lugar. No outro lugar o policial fez uma cara de “saco-cheio” e disse que eu poderia ir sozinho que a escolta policial seria me dada em Moenjo Daro.
Segui então para a van lotada, que levou 1 hora para percorrer os 30 quilômetros que separavam as duas cidades. Quando em Moenjo Daro, os policiais me chamaram para a sala deles, onde eu teria que preencher alguns papéis e pegar meu policial guarda-costas. Conversei com os policiais, que gostaram da minha barba muçulamana, e depois de alguns minutos eles me disseram que não havia problema com brasileiros e me deixaram seguir sem ninguém, para a minha alegria.
Conversando com as pessoas descobri que agora, que seria o pico da estação turística do país, eu havia sido o único turista da semana toda. Todos os estrageiros haviam fugido do país com medo de algum conflito e os que haviam planejado vir, mudaram de idéia após o Estado de Emergência declarado por Musharraf há pouco tempo. Em outras palavras, eu tinha as ruínas de Moenjo Daro quase que só para mim.
Não precisei de muito tempo para percorrer todo o local e depois de 3 horas alí já era hora de voltar para Sukkur, pois sabia que a viagem de volta também seria longa. Assim dei início ao retorno. Um rickshaw até o cruzamento das vans. Uma van até Larkana. Um rickshaw até o terminal de ônibus. Um ônibus até Sukkur. E um rickshaw até o hotel onde eu estava. Enfim, o passeio durou o dia todo, sendo que eu passei mais horas dentro dos desconfortáveis transportes que nas ruínas em si.
Agora eu tinha que deixar tudo pronto para segui na direção de Quetta amanhã ainda.
Sábado (24 de novembro de 2007)
Sukkur – Shikarpur (44 km)
Já me sentia bem para pedalar novamente e não levei muito tempo para deixar tudo pronto para seguir em frente. Como não queria perder muito tempo para me organizar, pedi um café da manhã do hotel. Esta simples refeição demorou mais que o normal e não foi nada de especial, mas o suficiente para me alimentar para uma boa pedalada.
Depois de comer eu já tinha tudo pornto para seguir em frente. Fui então para a estrada, onde tudo parecia normal. Em pouco mais de 1 hora de pedalada, comecei a sentir uma forte dor no estômago e não sabia o que era. Achei que poderia ser pelo café que eu havia tomado, mas na medida que a dor foi crescendo eu percebi que se fosse o café ele deveria estar estragado.
A dor foi se tornando tão intensa que eu já não conseguia pedalar. Fui obrigado a parar então na beira da pista, sentar no chão e apenas ficar parado, percebendo que eu tinha um grande problema agora. Quando levantei senti uma forte tontura e ânsia de vômito. Achei melhor vomitar aquilo que estava me fazendo mal e vomitei, mas não tanto quanto eu esperava e, aparentemente, longe do necesário também.
Subi na bicicleta mais uma vez e com a velocidade extremamente baixa eu segui em frente. Quando cheguei numa bifurcação não sinalizada eu resolvi parar no posto de gasolina e perguntar qual era o caminho para Jacobabad, onde eu queria chegar. Eles disseram que era o da direita. Perguntei então se eles tinham água, eles então perceberam que eu não estava bem e disseram que iriam me trazer água. Sentei então numa cadeira e esperei.
Quando a água chegou eu tomei boa parte da garrafa num gole só e depois deitei numa cama suja que eles havia trazido para mim. Acabei dormindo alí e quando levantei minha ânsia estava ainda mais forte, assim como as dores que eu sentia no estômago. Percebi que era hora de vomitar. Desta vez eu vomitei tudo ou quase tudo. Mas junto com o vômito, veio também uma diarréia. Nesse momento tive que admitir que eu não chegaria em Jacobabad hoje. Teria que ficar por Shikarpur e seguir viagem pela manhã.
Perguntei se havia algum hotel na cidade e eles disseram que sim, porém como turista, eu era obrigado a ser escoltado por policiais nesta cidade. Assim, eles ligaram para a polícia, que chegou em pouco tempo e me conduziu até a delegacia da pequena cidade. Na delegacia que parecia mais uma mercado de peixe, eu preenchi meus dados em algumas folhas e depois tive que esperar um policial chegar para me conduzir até o hotel, localizado a 50 metros da delegacia.
Devo confessar que aquilo não era nada agradável. Eu não podia ir para lugar algum sem o policial e eles eram chatos. O hotel era uma porcaria e sujo e os policiais ficavam a cada 5 minutos batendo em minha porta ou entrando em meu quarto. Um deles até arrombou a porta do meu quarto, para meu susto, pensando que um grito que ele havia escutado viera de dentro do quarto que eu estava. Bem, em resumo, a noite não foi fácil.
Eu que não tinha apetite algum, me contentei em comer algumas tangerinas e bananas, para então guardar minhas energias para conseguir deixar a cidade ainda amanhã.
Domingo (25 de novembro de 2007)
Shikarpur – Jacobabad (41 km) – Quetta
Às 6 da manhã os policiais já batiam à minha porta, o que me fez despertar nenhum um pouco feliz. Falei para eles pararem de bater na porta e que eu já iria começar a arrumar tudo para ir embora em pouco tempo. Depois de mais algumas dezenas de batidas na porta e de entrarem no quarto, eu estava com tudo pronto para seguir viagem.
Não me sentia muito bem, mas sabia que poderia pedalar um pouco. Mesmo assim, um veículo chegou até a porta do pulgueiro onde eu estava ficando e me obrigou a colocar a bicicleta na caçamba da caminhonete dele. Como não tinha escolha, coloquei. Ele então deu uma volta pela cidade e quando chegou na estrada, esperou um outro policial chegar e me levar escoltar até Jacobabad.
Este oputro policial estava de moto e me deixou pedalar. Assim, eu pedalei até Jacobabad, cerca de 40 quilômetros, o que não foi uma boa idéia, já que eu ainda não estava em condições de pedalar longas distâncias, devido à minha saúde. Quando chegamos em Jacobabad, os policiais disseram que me levariam até Quetta. Assim, eu pedalei até o limite onde eu poderia pedalar, a fronteira com o Balochistão. O motivo disso era simples, a 2 dias atrás foi morto um dos líderes e guerrilheiros da região, chamado Balach Khan Mari, parente de Nawab Akber Khan Bhugti, que foi morto no ano passado, pelas tropas do exército paquistanês. Isso resulou e resulta numa certa instabilidade na região que se opõe a Musharraf e se envolve em conflitos com os militares.
Da fronteira em diante, coloquei minha bicicleta na caçamba de uma caminhonete e segui em frente. Pensei que eles me levariam diretamente até Quetta, que estava a mais de 300 quilômetros dalí, mas percebi que não. A cada 10 quilômetros, eles faziam a troca, ou seja, eu tinha que pular de uma caminhonete para outra com minha bicicleta. Aquilo não era nada agradável, pois o tempo perdido em cada troca não era pequeno, sendo que em cada veículo havia 4 ou 5 policiais e nenhum deles me ajudava.
Depois de 7 caminhonetes e cerca de 50 quilômetros, eu percebi que aquilo era a coisa mais imbecil que eu já tinha visto. Apesar dos policiais não falarem inglês eu tentei me comunicar com eles para que eles me deixassem num ônibus direto para Quetta, o que seria menos doloroso que ficar trocando de veículo a cada 10 minutos e agüentando os policiais, o que talvez fosse o pior de tudo.
Eu já havia pedido isso antes, mas eles apenas havia me dito que me levariam até o terminal de ônibus, mas não levavam. Tive a impressão que eles gostavam de conduzir turistas pela estrada. Mas desta vez, estes policiais me levaram até o terminal de ônibus, que era no meio da estrada, no meio de uma cidade e no meio de um mercado de frutas, ou seja, algo completamente caótico. Os sujeitos do ônibus colocaram minhas malas e bicicleta no topo do veículo e quando eu entrei no ônibus percebi que não havia lugar para mim a não ser também no topo do ônibus.
Fui para cima e ganhei uma vista incrível enquanto viajava os 300 quilômetros que me separavam de Quetta. De cima do ônibus, eu pude ver o porque da polícia não deixar ninguém viajar sozinho pela região. O local é completamente deserto, para onde se olhe só se vê pedras e terra, nada mais. Até mesmo as cidades que me mapa mostrava, não era mais que um conjunto de casas feitas de barro. Percebi que mesmo sem os perigos dos terroristas, eu teria bastante trabalho para pedalar por alí.
A viagem durou cerca de 5 horas e somente do final do dia eu cheguei em Quetta, um pouco perdido nesta cidade fria, de pessoas bastante peculiares. Não há ninguém na rua que não use algum pano ou um tipo de chapéu diferente em sua cabeça. O motivo disso é simples, a população é simples e, basicamente, de origem tribal, como quase todo o Balochistão, região dividida entre o Paquistão, Afeganistão e Irã.
Fui então para o centro da cidade, onde para procurar um lugar para ficar dentro das noites frias de Quetta. Encontrar hotéis foi fácil, porém encontrar um para ficar foi mais difícil. Não sei porque, mas muitos deles estavam lotados (ou simplesmente disseram que estava lotados porque não queriam turistas e outros eram ruins de verdade, quase que indianos). Depois de diversas tentativas encontrei um lugar razoável para ficar, onde apenas coloquei minhas coisas e depois saí para comer.
Encontrei um restaurante bom e resolvi comer um peixe frito, o que parecia ser uma boa idéia. Comi bastante e logo percebi que era cedo demais para fazer uma refeição como essa, depois de todos os problemas que eu havia tido. Ao voltar para o hotel eu já não me sentia bem, mas o cansaço logo me levou para a cama e apenas adiou os efeitos desta pesada refeição.
Segunda-feira (26 de novembro de 2007)
Quetta
Ainda na cama, não demorei a descobrir que eu tinha sérios probelmas. Logo pela manhã eu já não conseguia mais sair do banheiro, numa disenteria complicada, que estava até me desidratando, de tanta água que eu estava perdendo. Pelos sintomas que eu estava tendo percebi que o que eu tinha era um parasita chamado Giardia lambia, geralmente chamada apenas de giardia. (eu tive isso, perdi 5 kilos em uma semana)
Estava arrotando bastante, sempre com gosto de “ovo”, sendo que eu não havia comido ovo, tinha uma disenteria forte e não tinha apetite. Enfim, tinha giardia. Agora precisava saber o que fazer para acabar com o problema. Já não queria perder meu tempo indo até um médico, pois o que ele iria me receitar eu já sabia. Resolvi apenas confirmar na internet, nuns sites de medicina e pronto, já tinha meu auto-diagnóstico e meu auto-medicamento. (também fiz isso hehehe)
Precisava tomar uma dose alta de tinidazol, a mesma droga que eu tomei contra a ameba, porém desta vez numa dose única e pesada, aparentemente suficiente para acabar com o meu problema. Comprei então o remédio, comprei yogurt e alguns probiótios para ajudar a recuperar a minha flora intestinal. Agora me restava descansar e não gastar energia. Fiquei vendo televisão e depois fui para a internet ver alguns e-mails, para resumir o meu dia.
Terça-feira (27 de novembro de 2007)
Quetta – direção à fronteira com o Irã
Acordei já me sentindo melhor. A diarréia havia acabado e já não me sentia tão fraco. Sentindo-me bem resolvi solucionar os probelmas que eu tinha com o meu visto, que iria acabar amanhã, assim para ficar mais no país eu teria que estendê-lo, porém para fazer isso eu teria primeiro que saber se eu poderia pedalar até a fronteira, o que eu teria que descobrir com a polícia.
Fui então até a delegacia da cidade e perguntei para o delegado se eu poderia pedalar até a fronteira. A resposta que ele me deu, eu já esperava: não. A polícia poderia me conduzir até fornteira se eu quisesse, fazendo dezenas de trocas de caminhonetes como eu havia feito antes, por isso, eles aconselhavam todos os viajantes a tomar um ônibus e evitar problemas.
Com essa resposta eu já não tinha muito o que pensar. Não havia mais razão para estender meu visto, sendo que eu já não poderia pedalar pelo país. Agora me restava arrumar tudo para deixar o país. Quando já tinha tudo pronto, resolvi então visitar uma fundação presente em Quetta, relacionada à saúde pública do Paquistão. A chamada Fundação Maulana Muhammadumar tinha uma papel importante na saúde de Quetta e de todo o Balochistão, já que a maioria da população desse estado segue para Quetta quando precisa de atendimento médico.
Após toda esta conversa, eu tinha pouco tempo para tomar meu ônibus até a cidade de Taftan, localizada na fronteira Paquistão/Irã. O ônibus sairia às 6 horas da tarde e levaria de 10 a 12 horas para chegar até o borda do país. Às 5:30 eu saí da minha hospedagem em direção terminal de ônibus e alí percebi o que me esperava. Por fora o ônibus parecia bom, mas por dentro não era muito confortável, especialmente para uma viagem de 12 horas, de qualquer forma, era o melhor que havia para lá.
A viagem começou e logo eu percebi qual seria a maior dificuldade, a estrada. A estrada era horrível, não contava com asfalto e estava impregnadas de pedras e buracos, o que fazia o ônibus trepidar bastante e o ato de dormir um desafio para qualquer passageiro. Mesmo assim, me esforcei para dormir e quando conseguia sempre havia algo para me acordar. O motorista acendendo as luzes do ônibus de brincadeira ou colocando a música mais alto que de costume, a polícia entrando no ônibus para me fazer descer e preencher papéis que não serviam de nada ou, simplesmente, todos descendo para comer e beber no meio do deserto.
Foi nessa viagem desconfortável, fria e insalubre que eu vi meus dias de Paquistão acabarem no meio desta noite e darem lugar para uma outra parte do mundo, o Oriente Médio. Mas esta já é outra história.
The End
=)
Espero que tenham gostado
2 comments:
Eu amei! LI TUDO! Mas ele tem mágoa no coração com os indianos hauhauhauhauha!
Deveria ter mais foto, mimimimi.
Cadê o site? mimimimi.
tah ain o post de baixoooooo
fotos, links tudoo
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